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Os Tempos em que Vivemos

Um olhar, uma tentativa de compreensão sobre algumas coisas que são vida.

Os Tempos em que Vivemos

Um olhar, uma tentativa de compreensão sobre algumas coisas que são vida.

Viagra e o paradoxo do sexo

A ereção é um dos últimos vestígios da espontaneidade autêntica, qualquer coisa de não inteiramente dominável por meio de operações racionais-instrumentais”, Adorno.
O homem que toma Viagra é um homem com pénis mas sem falo”.

 

Não é por acaso que a ereção é considerada importante, não só em si, mas também pelo que ela representa. E no entanto, pensando bem, ela constitui um paradoxo porque, se por um lado depende inteiramente de mim, do meu espírito, ela é ao mesmo tempo, algo sobre o qual não tenho qualquer controle. Razão tinha Santo Agostinho ao considerar que o facto de a ereção escapar ao controle da vontade humana fosse um sinal de punição divina, para assim castigar a arrogância e a pretensão do homem em se tornar senhor do universo. Ou seja, estivemos a um pequeno passo de dominar o universo.


Curiosamente é exatamente por “a ereção ser um dos últimos vestígios da espontaneidade autêntica, qualquer coisa de não inteiramente dominável por meio de operações racionais-instrumentais”, por essa indeterminação inconsciente não constituir qualquer problema para o homem, que um homem sexualmente potente suscita atração e desejo. É esse algo que ele tem mas que não detém, que o faz aparecer como recetáculo de um poder especial e milagroso que habita nele.


Compreender-se-á melhor o que quero dizer se fizermos a distinção entre o membro erétil que é o pénis e o falo representante da potência, da dimensão simbólica que confere autoridade. É como só pelo simples fato de se ser macho, essa dimensão simbólica induzisse potência ao seu membro. Tal como quando um juiz exerce a autoridade a partir do momento em que começa a falar em nome da Lei, excede e ultrapassa o valor próprio que possa ter, que até pode ser pequeno, quando fala em nome próprio.
É por isto que quem tomar a pilula, vê o seu pénis funcionar mas perde o acesso à dimensão fálica da potência simbólica, ou seja, o homem que toma Viagra é um homem com pénis mas sem falo.


Daqui podem decorrer várias implicações com algumas consequências, para as quais não temos ainda respostas. Por exemplo:
Se o homem necessita de tomar a pílula para ter ereção, com que ideia ficará uma mulher sobre os seus poderes de atração e excitação?
E com que ideia ficará o homem sobre o seu verdadeiro estado psíquico ao não saber se a ‘sua’ ereção é realmente dele ou devido ao fármaco?
Retirado esse sinal de impotência devido à ingestão da pilula, sobre que outras formas é que essa insatisfação ou resistência se manifestará? Porque, não tenhamos ilusões, ela fica lá dentro.
Sendo vulgarmente aceite que o homem pensa quando o desejo surge, com a cabeça de baixo e não com a de cima, o que acontecerá quando for só a cabeça de cima a comandar?
Passando a ereção a ser uma operação meramente mecânica, não se estará a retirar a componente humana do ato sexual? Ou dito de outra forma, será necessária a componente humana do ato sexual?


São perguntas deste tipo, e outras, que nos poderão aproximar mais da tentativa de saber o que é vida humana, sempre entendendo que tudo o que dela decorrer não exista separado da demais realidade. Não as fazer, substituindo-as pela mera ação ‘curativa’, vai afastar-nos cada vez mais da tentativa para a pretensão de compreendermos o que somos.

 

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