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Os Tempos em que Vivemos

Um olhar, uma tentativa de compreensão sobre algumas coisas que são vida.

Os Tempos em que Vivemos

Um olhar, uma tentativa de compreensão sobre algumas coisas que são vida.

Fábricas de papas e bolos

 

Os meios de comunicação social, os media, servem para conseguirem mobilizar o apoio da população para os interesses especiais que dominam o estado e a atividade privada. Só com esta perspetiva poderemos ser capazes de entender o seu funcionamento.

 

A fabricação do consentimento pelos meios de comunicação social faz parte do funcionamento regular de um governo”, Walter Lippmann, 1921.

 

"Nos países em que o poder se encontra nas mãos de uma burocracia do estado, é fácil verificar que o controle sobre os media se exerce de forma monopolística onde se inclui um sistema de censura oficial, com o fim de servir uma elite dominante. Já se torna muito mais difícil de verificar a utilização da propaganda quando os media estão nas mãos de privados e onde a censura formal se diz inexistente.”

 

“A liberdade da imprensa está garantida apenas para aqueles que são donos dela”, A. J. Liebling.

 

 

 

Fabricação consentimento.jpg

 

 

 

 

 

Tem vindo a ser-nos dito que os media são independentes e que têm por missão o relato e a descoberta da verdade, sendo as suas escolhas baseadas em critérios estritamente objetivos e profissionais.

Contudo, se os poderosos grupos de pressão de que dependem, entenderem limitar o que o público possa ver, ouvir, ler ou pensar, e controlarem a opinião pública através de campanhas de propaganda, então, a visão que teremos dos media e da sua missão, será totalmente diferente do que nos tem vindo a ser dito.

 

Numa sociedade em que a concentração de riqueza é cada vez maior e em que os conflitos de interesses das classes são enormes, a função que os media desempenham de divertir, entreter, informar, inculcar nas pessoas valores, crenças e códigos de comportamento, só poderá ser desempenhada se eles estiverem integrados numa estrutura institucional alargada e se utilizarem a propaganda de maneira sistemática.

 

Nos países em que o poder se encontra nas mãos de uma burocracia do estado, é fácil verificar que o controle sobre os media se exerce de forma monopolística onde se inclui um sistema de censura oficial, com o fim de servir uma elite dominante. Já se torna muito mais difícil de verificar a utilização da propaganda quando os media estão nas mãos de privados e onde a censura formal se diz inexistente.

 

Para que nos possamos orientar por entre as variadas rotas em que o dinheiro e o poder se infiltram, se interpenetram e se conjugam, a fim de que determinadas notícias sejam publicadas e outras sejam omitidas ou adulteradas, para que assim seja possível ao governo e aos interesses privados dominantes poderem fazer chegar as suas mensagens ao público, vou socorrer-me do livro Manufacturing Consent, The Political Economy of the Mass Media, de Edward S. Herman e Noam Chomsky, análise especialmente vocacionada para o tecido dos media americanos, mas que, exatamente por isso e salvaguardadas as devidas proporções,  tem aplicação universal.

 

A tese dos autores é que os media para poderem desempenhar efetivamente a sua função, necessitam de criar um modelo de propaganda, e que esse modelo de propaganda assenta no controle das notícias.

Este controle obtém-se fazendo passar por variados e sucessivos filtros toda a matéria em bruto das notícias, até ela acabar por ficar depurada e pronta para ser dada a conhecer.   

 

  1. Um primeiro filtro é o constituído pelo enorme investimento inicial necessário, pelo tipo de propriedade da empresa, pela riqueza do dono e pelo tipo de orientação prosseguido para a obtenção de lucro.

 

 Um dos primeiros obstáculos ao aparecimento de meios de comunicação tem que ver com o grande investimento inicial necessário. E isto já vem de longe: em 1851, para se lançar um jornal em Nova Iorque estimava-se como mínimo suficiente uma quantia de $69.000; em 1872, a venda pública do St. Louis Democrat, atingia o valor de $456.000, mas em 1920, a venda de empresas de jornais estava-se já a fazer a valores oscilando entre os $6 e os $18 milhões.

 

Outro dos obstáculos tem origem na concentração das empresas. Em 1986, existiam nos EUA 1.500 jornais diários, 11.000 revistas, 9.000 estações de rádio,1.500 estações de TV, 2.400 editoras de livros e sete estúdios de cinema, perfazendo um total de 25.000 entidades de media. Contudo, mais de metade destes jornais, revistas, livros e filmes eram propriedade de apenas 29 empresas.

As três redes de televisão, a ABC, a CBS e a NBC (da General Electric),  os dez principais jornais, o New York Times, Washington Post, Los Angeles Times (Times-Mirror), Wall Street Journal (Dow Jones), Knight-Ridder, Gannett, Hearst, Scripps-Howard, New-house e Tribune Company, as cinco maiores revistas, Time, Newsweek (Washington Post), Reader’s Digest e U.S. News & World Report, um maior editor de livros, McGraw-Hill, e sete dos maiores sistemas de TV por cabo, Murdoch, Turner, Cox, General Corp., Taft, Storer e Group W (Westinghouse), todas elas companhias que estão colocadas no primeiro terço das mais importantes dos EUA, são propriedade e controladas por pessoas de enorme riqueza.

 

O controle familiar de algumas destas empresas tem vindo a sofrer imensas pressões porquanto, a partir da altura em que muitas das empresas passaram a estar cotadas em bolsa, as famílias proprietárias encontram-se divididas sobre se devem aproveitar as vantagens oferecidas pelas oportunidades da cotação em bolsa ou se devem continuar a manter o controle familiar.

Acresce ainda que a desregulamentação aprovada sobre a limitação à concentração dos media e a maior abertura ao uso das ondas hertzianas, vieram permitir a realização de uma série de takeovers (ações de aquisição, amigáveis ou não) que vão acabar por obrigar as famílias proprietárias dos media a maiores endividamentos para poderem resistir a essas ações. Como resultado, têm de procurar obter, mais agressivamente, uma maior rentabilidade.

Em qualquer dos casos, o que vai acontecer é esses proprietários irem progressivamente perdendo autonomia para banqueiros, instituições de investimento e outros grandes investidores individuais a quem recorrem para obterem crédito.

Bancos e outros investidores institucionais começam a ser proprietários de muitas ações dessas companhias de media. E muito embora essas ações possa não lhes garantir o controle das empresas, permite-lhes, no entanto, que sejam ouvidos, influenciando a condução e desempenho da companhia.

 

Os grupos que controlam os media vão estabelecer assim um contacto mais direto com a comunidade das grandes corporações económicas e financeiras, através dos seus diretores e outras ligações sociais.

 Os conselhos das direções passam a ser dominados por executivos da banca e das grandes corporações exteriores às próprias corporações de media.

Das dez maiores gigantes dos media, 2/3 dos diretores vem de fora. Duma amostra sobre 95 destes diretores de fora, verificamos que eles exercem também cargos de direção em 36 bancos e em outras 255 empresas (Peter Dreier, “The Position of the Press in the U.S. Power Structure”).

 

Por outro lado, também as companhias de media se aproveitam destes contactos, diversificando-se para outros negócios para além dos media. Por exemplo, as duas maiores companhias, a GE, dona da RCA e NBC, e a Westinghouse, dona de várias grandes estações de TV, radio e rede de cabo, diversificaram para outras grandes áreas como as do armamento e do nuclear.

A indústria de armamentos é uma área altamente centralizada e secreta, particularmente influente ao nível das “decisões” políticas. Só que esta influência, também faz com que a GE e a Westinghouse fiquem dependentes do governo para que este subsidie a pesquisa e desenvolvimento do nuclear e da indústria militar, e ainda para a criação de um “clima” favorável nas relações com outros países, o que lhes facilitaria possíveis vendas.

Os gigantes dos media, as agências de publicidade e as grandes multinacionais, têm interesses comuns na criação deste clima favorável para os investimentos fora dos EUA. Daí que as suas inter-relações com o governo sejam, no que diz respeito a estas políticas, simbióticas.

 

Mas, as ligações e dependências com o governo, vêm também dos mecanismos da regulamentação com vista ao licenciamento e franquias a pagar. Daí o lobbying permanente e a troca de expedientes.

Não é de espantar que 15 dos 95 diretores das dez maiores companhias de media tenham sido previamente membros de governos. É a transferência constante, a porta giratória, entre quem em nome do governo legisla, regula, e as companhias que tinham sido reguladas por esses reguladores.

 

Assim, são todos estes interesses comuns entre companhias de media, outras grandes corporações, bancos e governo, que constituem o primeiro grande filtro que afeta a escolha de notícias.

Adenda: quando os neoconservadores falam do domínio dos media pelos “liberais”, estão certamente a referirem-se a estes e aos outros diretores que controlam estas grandes corporações e o governo!

 

  1. Um segundo filtro é o constituído pela publicidade.

 

Antes da publicidade se tornar preponderante, para que um jornal se mantivesse em circulação, os custos teriam de serem cobertos pelo preço arrecadado com a venda.

Com o crescimento da publicidade, os jornais que conseguiam atrair anúncios, começaram a produzir unidades a um preço muito mais baixo. Os que não conseguiam, acabavam ou por diminuírem o número de jornais vendidos, ou por os vender a um preço superior, ou por cortarem nos lucros ou na qualidade do papel, formatos e artigos, normalmente acabando por desaparecerem.

Já em 1856, um executivo da publicidade, defendia que não se deviam colocar anúncios em certos jornais, porque “os seus leitores não são compradores, pelo que qualquer dinheiro gasto em publicidade nesses jornais é dinheiro deitado fora.

As escolhas dos anunciantes é que influenciam a prosperidade e sobrevivência dos media. E, essas escolhas alicerçam-se em critérios económicos e políticos.

 

Exemplar o que aconteceu com a imprensa social-democrata na Grã-Bretanha do pós-Guerra, que, apesar da sua enorme circulação (por exemplo, o Daily Herald tinha 8,1% da circulação diária nacional, e tinha o dobro dos leitores do The Times, do Finantial Times e do Guardian), foi sendo progressivamente asfixiada devido à falta de anunciantes.

O desaparecimento desses jornais constituiu uma importante contribuição para o declínio do partido Trabalhista. Um movimento de massas sem qualquer media de suporte, ainda por cima sujeito a grande hostilidade por parte da imprensa dominante, fica em séria desvantagem para lutar pelos seus interesses.

Os anúncios, a publicidade, foram um poderoso mecanismo de enfraquecimento da imprensa das classes menos abastadas. A publicidade não é pois aquele sistema neutral onde é a escolha do comprador final que decide.

 

Mas, os anunciantes também utilizam esse seu poder sobre os programas e artigos a serem exibidos ou publicados. Programas que critiquem atividades das corporações dos media, expondo problemas que envolvam a degradação do ambiente, ou as ações do complexo militar-industrial, ou desaprovação de tiranias que sejam suportadas ou de que beneficiem essas corporações, verão os seus custos serem sempre só suportados pela empresa de media que os produzem.

Este seu poder manifesta-se até na própria duração dos programas, encurtando-os por forma a poderem conter maior número de anúncios.

 

  1. Um terceiro filtro é o constituído pelas fontes de notícias dos media.

 

Os media precisam de fornecimento constantes de notícias a tempo de conseguirem encher os horários programados. Como não têm possibilidades para terem jornalistas e câmaras em todos os locais onde as notícias possam acontecer, são economicamente forçados a concentrarem os recursos nos sítios onde as prováveis notícias possam acontecer, quer através de rumores ou de fugas de informação, ou nas conferências de imprensa agendadas.

O Governo, Presidência da República, Ministérios, Câmaras Municipais, Polícia, Hospitais, grandes Empresas, são fontes facilmente reconhecidas e tidas como credíveis para o fornecimento de notícias.

 

Nos grandes países, a quantidade enorme da informação pública é só por si suficiente para alimentar todos os media.

Nos EUA, o Pentágono tem um serviço de informação com milhares de empregados, com um orçamento de várias centenas de milhões de dólares. Segundo o Armed Forces Journal, o Pentágono publicava em 1971, 371 revistas com o custo anual de 57 milhões de dólares, e 1.203 jornais, o que significava que era um editor 16 vezes maior que o maior editor da nação.

 Num raro e único caso de abertura, a Força Aérea Americana (United States Air Force, “Fact Sheet: The United States Air Force Information Program”, março 1979) tornou público que o seu serviço de informações incluía:

140 jornais, 690.000 cópias por semana; Revista Airman, circulação mensal de 125.000; 34 estações de rádio e 17 de televisão; 615.000 notícias internas; 45.000 notícias para o exterior; 3.200 conferências de imprensa; 500 voos para orientação dos media; 50 encontros com direções editoriais; 11.000 palestras; 148 filmes, dos quais 24 nos circuitos comerciais.

Todos estes números nunca mais foram atualizados pelo que é de supor que não devam ter diminuído.

 

Só o sector das grandes corporações empresariais tem os recursos suficientes para produzir informações e propaganda em maior escala que o setor público.

Por exemplo, a U.S. Chamber of Commerce (Câmara de Comércio dos EUA), entidade privada coletiva, tinha em 1983 um orçamento de 65 milhões de dólares para comunicações e atividades políticas. Publicava uma revista (Nation’s Business) com uma circulação de 1,3 milhões e um semanário com 740.000 subscritores, um programa semanal distribuído por 400 estações de rádio, e painéis de discussão semanais em 128 estações comerciais de televisão.

Para além da Câmara de Comércio, há ainda que contar com as câmaras de comércio dos vários estados, com as câmaras locais e ainda com as associações de comércio, todas elas envolvidas em atividades de relações públicas e lobbying, com um total de mais de 150.000 profissionais.

 

Para consolidarem o seu estatuto, todos estes promotores de notícias, ligados ao governo e às corporações, esforçam-se por facilitarem o mais possível o trabalho dos jornalistas dos media, quer entregando-lhes cópias dos discursos e posições a virem a ser tomadas, quer elaborando press releases (resumos) aptos a serem usadas de imediato em linguagem jornalística, sessões de fotos, horários compatíveis, etc.

Isto é uma forma de reduzirem os custos que deveriam ser suportados pelos media, ou seja, estão assim a subsidiá-los. O que no caso dos departamentos do estado não deixa de ser curioso, porquanto tal é feito à custa dos contribuintes. Os cidadãos pagam para serem propagandeados pelos interesses dos grupos poderosos que rodeiam o estado.

 

Com este sistema tão bem montado de relações e de fontes “credíveis”, como é que os media podem vir a criticar ou a emitir outras visões que ponham em causa quem lhes fornece quase tudo a custos zero?

 

Mas esta relação entre o poder e as fontes vai para além do fornecimento “gratuito” de notícias. Para além das “fontes oficiais” que, de tão frequentemente citadas, podem perder o crédito, o pacote passa também pelo fornecimento de “especialistas”, apresentados como fontes não oficiais altamente respeitáveis que servem para credibilizar as fontes oficiais.

A criação deste corpo de especialistas é feita deliberadamente e em larga escala. Atentemos no que escreveu o Juiz Lewis Powell, num memorando para a Câmara de Comércio dos EUA em que a aconselhava a “comprar os académicos de topo das Universidades para conferir credibilidade aos estudos das corporações e poder também dar aos negócios uma voz mais forte que se faça ouvir nos campos universitários”.

Esta “compra” seria feita quer pagando-lhes como consultores, quer financiando as suas pesquisas, quer organizando conferências fechadas de especialistas (think tanks) em que eles fossem diretamente recrutados, ajudando a disseminar as suas mensagens.

Exemplo característico era o do afamado programa de televisão “McNeil-Leher News Hour”, onde 54% dos comentadores “especialistas” em terrorismo e defesa eram ou tinham sido membros do governo e 15,7% vinham de think tanks da ala mais conservadora, que tão depressa ocupavam posições no aparelho do estado como nas organizações privadas.

Também os próprios media tinham os seus “especialistas”, nomeadamente os que tivessem publicado trabalhos sobre o KGB, ou que tivessem abandonado a URSS (na altura), ou ainda radicais que tivessem finalmente “visto a luz”, tendo-se convertido.

A finalidade era a de providenciar a criação de um manancial inesgotável de “especialistas” que diriam aquilo que as entidades queriam.

 

  1. Um quarto filtro é o constituído pelos “grupos de pressão”.

 

Os “grupos de pressão”, como resposta a posições ou programas dos media, aparecem na forma de e-mails, cartas, chamadas telefónicas, petições, ações em tribunal, discursos e moções na Assembleia, e ainda por outros modos de queixa, ameaça, ou de ação punitiva. Podem ser organizados centralmente ou localmente, ou consistirem em ações individuais inteiramente independentes.

Podem manifestar-se diretamente, quando têm origem nas fontes máximas de poder, ou indiretamente, através dos acionistas, empregados, ou por organizações que se pretendiam como representantes de interesses importantes da sociedade.

 

Dois exemplos: o Center for Media and Public Affairs, de Linda e Robert Lichter, que se assumia como um instituto “não lucrativo, não partidário”, tinham como principais colaboradores Patrick Buchanan, Faith Whittlesey e Ronald Reagan (o futuro Presidente), que pugnavam por uma imprensa objetiva e correta, porquanto consideravam que os media eram controlados por liberais anti empresas.

Outro, o AIM, fundado maioritariamente por grandes empresas (pelo menos oito empresas petrolíferas eram seus contribuintes) e herdeiros multimilionários, com a finalidade de pressionarem os media a seguirem a sua agenda de política externa altamente conservadora.

 

Os media, raramente se desviam da linha programática apontada por esses grupos de pressão que impõem o seu ponto de vista, não só não os questionando como até lhes dando espaços, a eles e aos tais “especialistas”. Isto é o reflexo do poder dos patrocinadores e da direita nos mesmos meios de comunicação.

 

  1. O quinto filtro é o constituído pelo anticomunismo como mecanismo de controle.

 

O anticomunismo como ideologia serve para mobilizar a população contra o inimigo, e como o conceito é muito largo, pode ser usado contra quem quer que seja que advogue políticas que vão contra os interesses de propriedade ou que advogue atitudes de acomodação para com estados comunistas ou que advogue radicalismos.

Ajuda, assim, a fragmentar os movimentos de esquerda e os movimentos sindicais, servindo como um mecanismo de controle político.

Sendo o triunfo do comunismo o pior resultado possível, tal justificará o apoio aos fascismos como mal menor. Daí os sociais-democratas serem vistos como demasiado moles para com os comunistas, e os liberais serem acusados de serem pró-comunistas ou insuficientemente anticomunistas, sendo assim colocados continuamente na defensiva num meio em que o anticomunismo é a religião dominante.

Este mecanismo de controle anticomunista exerce profunda influência nos meios de comunicação. Daí a tendência normal de enquadrar tudo em termos de comunista ou anticomunista, dando especial relevo a tudo o que seja anticomunista, desde os desertores, informadores e outros que “abandonem” o comunismo e que rapidamente são erigidos em especialistas, até às campanhas de propaganda sem fim. A ideologia e a religião anticomunista são filtros muito potentes.

 

A dicotomia massiva e sistemática

 

Perante o acima exposto, esta dicotomia das notícias dadas pelos media aparece-nos de forma natural como resultado da existência dos vários filtros. Na prática, é como se houvesse um comissário político que desse instruções aos media:Concentrem-se nas vítimas das potências inimigas e esqueçam as vítimas dos amigos.”

 

Um dos exemplos visíveis foi o da diferença de tratamento dada pelos media aos massacres do regime de Pol Pot no Camboja (abril de 1975) que serviam os interesses da política americana no Vietname, e os massacres efetuados pela invasão Indonésia em Timor-Leste (dezembro de 1975), com total cobertura e beneplácito dos EUA (um dia antes da invasão, o Presidente Gerald Ford e o Secretário de Estado Henry Kissinger, deram aprovação  ao Presidente indonésio Suharto para prosseguir com a ação militar programada, conforme se pode ler na ata das conversações  (http://nsarchive.gwu.edu/NSAEBB/NSAEBB62/doc4.pdf).

Para quem não se recorde, de uma população de cerca de um milhão de timorenses, os generais de Suharto chacinaram um terço, muito mais que Pol Pot.

 

A nível interno, doméstico, esta dicotomia também se aplica. O tratamento dado às fraudes e evasões fiscais por parte dos poderosos é tratado pelos media de modo completamente diferente do dado à criminalização da pobreza.

É assim que a primeira é vista como até podendo ser aceite, sendo compreensível (trata-se de proteger os ganhos da vida o melhor possível, a má legislação nacional a isso obriga), ao passo que a segunda é tida como incompreensível, pois trata-se de receber sem nada fazer, de viver à custa dos que trabalham.

 

Esta dicotomia dos media de comunicação encontra-se por todo o lado, é massiva e sistemática. Vê-se não só ao nível das escolhas resultantes pela publicidade como pela supressão de notícias e pelas matérias escolhidas, mas ainda pelas formas como as matérias são colocadas e tratadas. Não é indiferente o horário, o tom, o contexto em que são inseridas, o tratamento ser exaustivo ou não.

 Esta diferenciação é sempre feita de acordo com os fins político-económicos a que se destinam. Exemplos não faltam, sendo suficiente saber ler, ouvir, ver e estar minimamente atento.

 

Em resumo:

Os meios de comunicação social, os media, servem para conseguirem mobilizar o apoio da população para os interesses especiais que dominam o estado e a atividade privada. Só com esta perspetiva poderemos ser capazes de entender o seu funcionamento.

 

 

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