(201) A hierarquia na ocupação dos galhos
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É agradável saber que temos sempre o controle da situação e nunca somos rejeitados.
Podemos mesmo bater-lhes, que não se estragam.
“Atuo como um gentleman. Nunca tenho sexo sem antes lhes pedir autorização. Durmo com elas. Cubro-as com um cobertor elétrico, e o silicone absorve o calor”.
Não se pode pretender ser anti preconceituoso quando se admite um robô sexual para homens, mas não um vibrador robótico dirigido ao orgasmo da vagina.
Não passando a pornografia de uma redução das mulheres a corpos, necrofilia, não é de espantar que a sua progressista indústria de enterros vivos tenha de estar atenta a todos os desenvolvimentos sociais e científicos, para daí obter rendimentos e proporcionar serviços apreciados e requisitados pelos clientes.
Dos serviços de “acompanhamento” aos bordéis, dos filmes aos “brinquedos” sexuais, sempre na vanguarda do entretenimento. O último êxito desta indústria, o da comercialização de bonecas de silicone especial em tamanho natural, tem rapidamente passado para o seu “aluguer” à hora em estabelecimentos próprios, espalhados pelas várias cidades e arredores das nações mais civilizadas (que, para este efeito, são todas).
Explicava uma vendedora da Lovable Dolls:
“Todas elas vêm com cabeças removíveis. Há uma grande variedade de cabeças. A cabeça pode ser retirada para se lhe colocar facilmente uma outra. Os olhos podem-se movimentar, tendo para tal o cuidado de se fazer pela parte de dentro para não se danificarem as pestanas […] Depois, são embaladas vestidas com lingerie, todas arranjadas. Sapatos, unhas feitas, maquilhagem e peruca. Expedimo-las com cabeça. Assim, quem as receber, ao desembalá-las, terá aquela sensação: ‘Uau!! A minha rapariga, pronta para usar’.”
Mais pormenores: as bonecas custam 7.500 dólares cada, feitas de acordo com as especificações individuais do comprador, vêm com vários tamanhos de mamas, línguas, bocas e vaginas, com sete cores diferentes de pele, e onze cores de olhos.
Nos salões de exposições, convidam-se os clientes a criarem as suas próprias bonecas, que normalmente são réplicas em silicone de artistas pornográficas presentes para sessão de autógrafos, que engloba também a possibilidade de se lhes poder apalpar o rabo ou tirar selfies.
No mostruário das Reed Dolls, podem ver-se torsos de mulher sem cabeça, sem pernas, expondo-se várias vaginas anatomicamente corretas, com pelos púbicos, onde os homens experimentam meter os dedos para sentirem o silicone.
Um dos clientes tem oito bonecas para uso próprio. A cada uma delas deu um nome. Coloca-as sentadas ou deitadas por toda a casa, para que quando chega a casa sinta que tem uma família. Compra-lhes roupa, maquilha-as, fala com elas, tira-lhes fotografias:
“Temos de ser criativos. Temos de fazê-las sentir que interagimos com elas. Podemos pô-las a fazer coisas com as mãos. Podemos por os seus braços à volta do nosso pescoço. Podemos colocá-las em qualquer posição, fotografá-las a usarem brinquedos sexuais. E é agradável saber que temos sempre o controle da situação e nunca somos rejeitados”.
Sempre que quer ter sexo com elas, põe-lhes lubrificante na boca, na vagina e no ânus. “Atuo como um gentleman. Nunca tenho sexo sem antes lhes pedir autorização. Durmo com elas. Cubro-as com um cobertor elétrico, e o silicone absorve o calor”.
“Pôr-me em cima delas é como estar em cima de uma pessoa. Estabeleço contato com os olhos delas, falo com elas como o faria com um animal de estimação, e elas não fogem. Pode-se mesmo bater-lhes, que não se estragam. Os seus movimentos são realistas.”
Comparando com mulheres reais, diz-nos ainda:
“Da minha experiência, mulheres que se pareçam com estas bonecas não são mentalmente ou emocionalmente estáveis. Onde é que eu encontraria quem fosse inteligente, atrativa, e que quisesse estar comigo? Embora as enormes mamas tornem muito difícil vesti-las, foi isso que me tornou num apreciador das peças do vestuário das mulheres”.
O passo seguinte foi o aparecimento de bordeis disfarçados, com estas bonecas como protagonistas. Alugadas à hora e meia-hora (os preços de agora, em Nova Iorque, são de 80 dólares por meia hora e de 120 por hora para clientes regulares, e de 300 dólares por 90 minutos para um serviço fora), os empreendedores mostram-se deliciados com a afluência de clientes.
As regras dos estabelecimentos implicam que as bonecas não possam ser violadas, ou espancadas. Os clientes devem usar preservativos. Após cada utilização as bonecas seguem para uma “estação de esterilização”, à base de água a ferver e sabão antibacteriano. As perucas sintéticas são substituídas semanalmente.
Uma das vantagens é que os serviços públicos de saúde não fazem inspeções de rotina a este serviço de arrendamento de bonecas.
Estão já na calha versões mais atualizadas com cabeças que se movem e podem produzir sons e até falar, e com Inteligência Artificial que lhes permitem memorizar os gostos de cada cliente. Evidentemente, a hora será mais cara.
A mostra internacional de 2019 de Produtos Eletrónicos de Consumo (CES, International Consumer Electronocs Show) que habitualmente se realiza em Las Vegas, informou a diretora da empresa Lora DiCarlo, que o seu produto Osé, um vibrador pessoal, fora selecionado como vencedor do prémio de Inovação na categoria de robótica e drones.
O vibrador em questão não precisava da utilização das mãos para funcionar, e que através da “nova tecnologia micro-robótica imitava perfeitamente todas as sensações da boca humana, língua, e dedos, tal como se se tratasse de um verdadeiro parceiro”.
Só que um mês depois, a Administração da CES, contactou a Lora DiCarlo informando-a de que não só lhe tinha sido retirado o prémio, como o produto não poderia ser exposto na CES 2019. E passou a explicar:
“O produto não deveria ter sido aceite para os prémios do programa de Inovação porque não se encaixava em nenhuma das categorias existentes”, e porque “todo o produto que a CTA (Consumer Technology Association) considerasse como sendo imoral, obsceno, indecente, profano, ou que não respeitasse a imagem que a CTA representava, seria desqualificado”.
O representante da Lora DiCarlo nota que “Osé” foi um “produto desenvolvido por uma equipa de engenheiros trabalhando em associação com a Universidade do Estado de Oregon, cujo laboratório de robótica é um dos melhores do país”.
Quanto à questão de nem sequer ser autorizado a mostrá-lo na Exposição, refere que “na CES de 2018 figurava uma boneca sexual para homens e uma empresa de vídeos pornográficos exibia-os aí há vários anos, permitindo que os homens vissem pornografia ali, em público. […] A sexualidade dos homens é permitida ser explícita com a apresentação de um robô sexual juntamente com a exibição de vídeos porno. Por outro lado, a sexualidade feminina, é excluída. Não se pode pretender ser anti preconceituoso quando se admite para exibição um robô sexual para homens, mas não um vibrador robótico dirigido ao orgasmo da vagina”.
Tarana Burke (1973-), negra americana nascida em Bronx, Nova Iorque, vítima ela própria de assalto e violência sexual, tornada ativista social perante a permissividade com que as jovens negras eram vistas e tratadas pela sociedade. Em 2003, desenvolveu o programa “Just be”, dirigido a todas as jovens negras entre os 12 e 0s 18 anos.
Em 2006, fundou o movimento “Me Too” que pretendia usar essa frase para despertar a sociedade para o problema do abuso sexual instituído e consentido pela sociedade. Várias foram as causas sociais que têm abraçado este movimento, a última das quais na Coreia do Sul em que dezenas de milhar de prostitutas organizadas obrigaram o Governo a reconhecerem os seus direitos.
Posteriormente, em 2017, a atriz Alyssa Milano, encorajou as mulheres que tivessem sido sujeitas a assalto sexual, a exporem as suas experiências no hashtag “#Me Too”. As campanhas deste movimento têm normalmente sido dirigidas contra homens que delas tenham abusado sexualmente ou que tenham expressado ideias ou palavras consideradas ofensivas.
Têm usado o exercício de um enorme poder mediático não verificado (um julgamento justo, o direito a dúvida razoável, …), e que se em parte possa ser considerado justo, não pode deixar de lembrar as purgas brutais dos momentos revolucionários em que esses excessos são compreensíveis por se tratar de uma mudança radical, mas que não deixam por isso mesmo serem indicadores do desvio dos objetivos iniciais.
Daí a hierarquia da ocupação dos galhos continuar a manter-se.